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“A nova Direção é uma amostra representativa do golfe em Portugal”
07/05/2024 16:11 Hugo Ribeiro
Nuno Sepúlveda liderou a única lista que se apresentou às eleições perante os 46 membros do CNIG © D.R.

Entrevista com Nuno Sepúlveda, recém-eleito presidente do Conselho Nacional da Indústria do Golfe

Recém-eleito presidente do Conselho Nacional da Indústria do Golfe (CNIG) para 2024-2027, Nuno Sepúlveda explica nesta entrevista como pretende resolver neste triénio as questões ligadas à água, ao IVA, ao regresso de um grande torneio, à falta de ‘data’ e ao melhor aproveitamento do PRR. E como, para tal, promete um mandato em que a diversidade dos seus membros é apresentada como uma força homogénea. 

GOLFTATTOO – Esta equipa de corpos sociais parece ser coesa e de pessoas que estão há muito tempo no golfe, com visão homogénea da modalidade. 

NUNO SEPÚLVEDA – Fomos buscar uma série de gente para a Direcção do CNIG que, de facto, tem muitos anos de golfe, mas não anos a mais. Pessoas que representam realidades muito diferentes do golfe, como o Luís Cameira do Estela perto do Porto, o Jorge Papa do Morgado do Reguengo, o Rodrigo Ulrich de Troia, Comporta, o próprio Alexandre Barroso (presidente da AG) também de Troia, o Pedro Castelo Branco de Royal Óbidos, o Ricardo Abreu do Clube de Golf do Santo da Serra na Madeira. A ideia foi trazermos uma amostra representativa do golfe em Portugal. Cada um com as suas verdades, qualidades e necessidades. 

GT – Foi uma lista única ou houve listas concorrentes? 

NS – Foi uma lista única, com todas as forças do golfe nacional envolvidas. Falei da Direção, mas se fossemos falar da Mesa da Assembleia Geral, se falarmos no Conselho Fiscal, por exemplo, com o Carlos Pinto Coelho (Quinta da Marinha), etc., acho que todas as pessoas envolvidas no negócio estão ali representadas. Isto é muito pequenino, somos 46 associados, e teria sido estranho não termos chegado a todos. 

GT – A presidência do CNIG já era ocupada por Vilamoura, com o Luís Correia da Silva… 

NS – … Eu já lá estava há seis meses e fui reeleito para um novo triénio. Apanhei foi o fim do mandato do Luís Correia da Silva. Mas desta vez a eleição foi mais pela equipa do que pela personalidade do presidente. Foi mais por aí. Por outro lado, no que particularmente diz-me respeito, eu venho pela Details, a empresa que gere os campos de Vilamoura, Palmares, Aroeira e Vale de Pisão. Já não é assim tão Vilamoura quanto isso. 

GT – Esses seis meses foram apenas de transição entre duas Direções, duas presidências. 

NS – Quando a Arrow comprou Vilamoura, os Dom Pedro, nós ocupámos o lugar que era do Dom Pedro, porque era uma função de empresa e não uma função pessoal. 

GT – Em termos de estrutura base há uma continuidade? Com o mesmo secretário… 

NS – … Continua a ter o mesmo secretário, o Hélder Ferreira, mas todas as pessoas que entraram para os corpos sociais perceberam que o CNIG vai ter de fazer diferente… 

GT – … Pois, isso leva-me a perguntar-lhe como é que estes novos corpos sociais do CNIG entendem a vossa função, o vosso lugar, no meio do golfe nacional. 

NS – Nos últimos anos o CNIG focou-se muito na questão da água. Somos uma associação da indústria do golfe, os representantes dos donos dos campos de golfe, temos de ter preocupações um bocadinho diferentes da Associação de Greenkeepers, da Federação Portuguesa de Golfe, da Associação de Gestores de Golf. Partilhamos as mesmas preocupações, mas temos de focar-nos nas nossas. 

G – Que são? 

NS – As nossas são a questão do IVA, a questão ligada à inexistência de informação e data. 

Neste momento temos um problema tremendo que é falarmos de coisas sem termos os números. Falamos consubstanciado em nada. 

O CNIG quer focar-se muito nos próximos tempos a defender o interesse dos seus associados, muito em particular ao nível da água, de todas as burocracias para as reduções das águas. 

Mas a questão do IVA tem de vir novo para cima da mesa. Tem de ser repensada, tem de ser falada. É um produto que está tão alinhado com comidas e bebidas como com hotéis. Estamos inseridos em resorts, em que tudo é o mesmo produto e isto tem de ser repensado, não diria ao nível do produto agrícola, mas tem de haver um ponto intermédio. E temos de ter informação para saber o que o golfe representa realmente em Portugal e para os seus donos, para os seus accionistas. Não sabemos qual o seu impacto verdadeiro. O último grande estudo que se fez foi da FPG com a Deloitte em 2019 e já estamos em 2024. Temos de ter números verdadeiros todos os dias. Temos de tomar decisões sobre os nossos negócios com real data. Queremos fazer uma série de estudos credenciados e certificados, até para desmistificar uma série de assuntos sobre os quais somos abordados no mercado. 

Por exemplo, dizem-nos que somos quem consome mais água. Há uma série de mitos e o golfe – e por golfe entenda-se o CNIG – não tem sido capaz de estar preparado para responder à letra e repor a verdade. A verdade sobre mitos como o golfe ser mau para o ambiente, o golfe consumir a água toda. Precisamos de ter uma presença de lóbi mais acertada, temos de reunirmo-nos com as pessoas certas, e precisamos de estar carregados de informação verdadeira para fazermos o nosso marketing positivo, porque do negativo já nós sofremos muito. Há que mudar essa narrativa. 

GT – Encomendar estudos é dispendioso. Não são estudos baratos. Isso significa que o orçamento do CNIG terá de ser elevado neste triénio? 

NS – Acho que acima de tudo não têm sido utilizadas as linhas de financiamento e oportunidades que existem. Há muitas linhas de financiamento para estudos, para internacionalização e reposicionamento. E no PRR existem imensas linhas que nem foram tocadas. Há empresas que fazem este género de estudos para várias organizações com uma série de oportunidades. Há que trabalhar um pouco mais, porque as coisas não vêm de borla, mas há coisas que estão disponíveis sem representarem necessariamente um custo acrescido.  

GT – Pegando nessa situação da água, é fundamental e ainda mais no Algarve, sobretudo depois dos cortes ao consumo que o anterior Governo teve de começar a fazer, que afectou todas as actividades económicas algarvias, incluindo o turismo. Esse tema veio de novo ao de cima, com determinados partidos políticos a clamarem contra a água que o golfe gasta no Algarve. Fala-se muito da necessidade da central de dessalinização de água do mar do Algarve, mas é apenas uma central, enquanto bem ao lado, em Espanha, há muitas mais, em 2022 eram 68… 

NS – … O CNIG quer ajudar nessa discussão, primeiro para desmistificá-la, segundo porque o problema não é vir a haver uma dessalinização em Albufeira ou não. A grande questão é quando é que as estações de tratamentos de águas residuais irão estar a funcionar e disponíveis para os campos de golfe. 

Nós estamos disponíveis para usar qualquer água que haja, não somos esquisitos. Agora, há estações de tratamento de água e é preciso que ponham-nas a funcionar. Não temos essa responsabilidade nem deixam-nos ter a gestão dessas estações de tratamento, porque são responsabilidade da administração pública, mas não funcionam. Nos casos em que não há essa opção, gostávamos também de poderem ser consideradas pequenas estações dessalinizadores ao nível de cada resort. Mas, mesmo assim, a burocracia não é nada fácil. É tanta, que mesmo que queiremos resolver os problemas com custos nossos, é difícil. E no nosso caso, a relva ou está viva ou morta e se está morta fecha o resort todo, o hotel, o F&B, tudo. Não é sermos mais importantes ou menos do que os outros, mas as nossas perdas têm consequências diferentes. 

GT – Tem uma noção de quantas ETAR estão a ser usadas para regas de campos de golfe? Lembro-me que já há 24 anos falava-se de várias ETAR que iriam ser colocadas à disposição dos campos de golfe e mesmo aí, em Vilamoura, falava-se de uma pequena estação que poderia suprir todas as necessidades. 

NS – A 100% não há nenhuma! A conversa é boa, a ideia é gira, estamos preparados, fizemos os estudos todos, assinámos protocolos, vamos pagar mais caro pela água, está tudo certo… excepto que nenhuma funciona! Há duas ou três ETAR que são mais relevantes, como a de Lagos que não está operacional. A de Castro Marim também está supostamente a funcionar, mas passam muitos dias em que não opera porque a qualidade de água tem contaminações e acaba por não funcionar a tempo inteiro. A de Vilamoura está a preparar-se para que em 2026 esteja operacional com água dessalinizada, mas na verdade, em termos concretos, não há uma nega dos campos de golfe em usarem a água reciclada, ela simplesmente não existe. E a gestão dessas águas é dos municípios e do Estado Central, não é nossa. 

GT – Esta questão da água é muito premente no Algarve. Não é assim em todo o território nacional. O CNIG é uma associação nacional. Os campos das outras zonas em que não existe falta de água compreendem o problema, percebem o drama? 

NS – Estão sensibilizados porque sabem que irá ser um problema. Não será hoje, como não o era no Algarve há quatro anos, mas vai chegar a toda a gente. Os proprietários de campos de golfe sabem perfeitamente que, ou por uma questão de limitação, ou por uma questão moral, a água é um assunto que toca a todos. Mesmo para quem, neste momento, tenha problemas de drenagem e não de falta de água. 

GT – Quando o actual presidente da FPG iniciou o seu actual mandato, o segundo, fiz-lhe uma entrevista para o jornal Record. Conversámos sobre a questão do consumo de água nos campos de golfe, que na altura estava a levantar alguns anticorpos junto de determinados partidos políticos pouco informados sobre o tema e, naturalmente, com posições demagógicas e pouco científicas. Perguntei-lhe sobre a necessidade de a FPG passar de forma mais consistente uma mensagem mais pedagógica sobre o tema para o espaço público e que isso poderia ser ajudado pelo mediatismo de que, felizmente, goza o presidente da Confederação de Turismo de Portugal, agora reeleito. Se ele fosse capaz de batalhar pela importância do golfe para o turismo, como o vemos na TV a lutar, por exemplo, pelo novo aeroporto, poderia haver outra eficácia na mensagem, até porque é uma personalidade eloquente. O Miguel Franco de Sousa respondeu-me que o elo de ligação do golfe com a Confederação do Turismo de Portugal é mais o CNIG do que a FPG. É esta a realidade? 

NS – Concordo e apoiamos o Francisco Calheiros, que tem-nos ajudado no que pode. Tem sido uma palavra forte a ajudar-nos, mas temos de ser muito mais fortes. E não pode ser com vergonha… 

GT – … É exactamente isso, a questão é não haver vergonha de falar-se sobre o tema no espaço público. 

NS – O problema é que as pessoas não sentem-se confortáveis, porque não há números verdadeiros e não é fácil. As pessoas sentem-se que podem ficar expostas com alguma facilidade, quando não temos aquela data, aquela informação certa para contrapor, para desmistificar, para argumentar. Todas as entidades têm de usar os mesmos dados, os mesmos exemplos, explicar as mesmas limitações. E mais, a questão de o CNIG estar mais ligado à Confederação do Turismo de Portugal – e também já conversei com o Miguel Franco de Sousa –, é que não podemos andar a trabalhar em separado. O mercado do golfe é demasiadamente pequenino para a FPG andar a fazer uma parte, o CNIG outra, a Associação dos Greenkeepers fazer outra, tem de haver primeiro uma concertação. 

E há outro assunto que é grande e esse toca na FPG, que é o Turismo de Portugal ter deixado de investir em eventos de golfe. Existem modalidades nas quais se investem milhões de euros, nomeadamente o surf, e o golfe passou a zero. Esta desproporcionalidade em retorno-investimento de uns para outros – e acho muito bem que se invista noutras modalidades –, não é correcta. Não está certo que deixe-se de investir no golfe. E queremos fazer voz grossa nesse assunto. Temos de explicar por A + B, com data, o impacto que o golfe tem, que esses eventos têm, como tinha a Fórmula Um e tem o Moto GP. Neste momento, o Sul de Espanha faz quatro ou cinco eventos de nível mundial e não é por caridade. Eles sabem do impacto positivo que têm na região e no país. Se fosse para perder dinheiro não faziam. 

GT – É impossível que o Portugal Masters não tenha um grande impacto nos campos do Algarve e que o seu desaparecimento não seja bastante negativo. 

NS – Como destino mundial de golfe, tem impacto em Portugal, no Algarve, e digo mais, um grande evento mundial de golfe não tem necessariamente de ser no Algarve. Nem é por aí. Tem é de ser em Portugal. A nossa concorrência não é ser em Lisboa, Porto ou Algarve, a nossa concorrência é se nada é feito em Portugal. A nossa preocupação é que seja feito em Portugal. Qualquer pessoa que viva de serviços à volta disto, tem interesse em voltar a ter um grande evento de golfe em Portugal. 

GT – Havendo uma mudança de Governo, poderá ser mais fácil recuperar um grande evento de golfe para Portugal? É importante neste processo a mudança de Governo? 

NS – A vontade política é importante, a cor política não. O Masters esteve no Algarve de 2007 a 2022. Passou por vários Governos. Percebemos que houve contextos diferentes. Houve alturas de investimento, alturas de recessão, houve a troika, toda a gente percebe que há contextos. Achamos que agora há um contexto positivo para repor um major event de golfe urgentemente e todas as organizações, seja DP World Tour, PGA Tour, todos estes grandes circuitos estão interessados em vir para Portugal. Era um dos torneios preferido dos jogadores. Um dos poucos em que traziam as famílias. É uma pena o que se passou. Faltam eventos de golfe em Portugal. Ponto! Acho que isso está assimilado. E o CNIG aí também tem de fazer força. 

GT Já percebi que a nova Direcção do CNIG quer juntar-se à FPG para voltarmos a ter um grande evento de golfe em Portugal… 

NS – … Não vamos juntar-nos, vamos alinhar-nos com a FPG, no sentido de percebermos o que cada um faz por si e o que cada um pode fazer em conjunto. Há assuntos em que temos de estar juntos, há assuntos em que cada um tem de ir à sua vida. O CNIG não tem nada a ver com o crescimento do mercado de jogadores em Portugal. Mas pode ajudar a ter campos disponíveis para termos novos jogadores em condições muito particulares. Há coisas em que tem de ser a FPG a liderar e nós podemos ajudar. Há coisas em que temos de ser nós a liderar com a FPG a ajudar-nos e há coisas em que temos de fazer juntos. 

GT – Isso leva-me a outra questão que é o facto de o João Paulo Sousa estar nos orgãos sociais do CNIG e de também estar nos da FPG e da Associação de Gestores de Golf, onde figuram igualmente Alexandre Barroso e Francisco Cadete, outros membros dos orgãos directivos do CNIG. Isso é positivo? 

NS – Quantas mais pessoas perceberem as dificuldades e ansiedades de cada um dos lados, melhor. No CNIG temos a ideia de precisarmos de uma concertação, umas duas vezes por ano, com todas as partes envolvidas. Precisamos de reuniões bianuais com o CNIG, FPG, Associação de Greenkeepers, Associação de Gestores, PGA de Portugal… temos de sentarmo-nos à mesa duas vezes por ano para vermos os alinhamentos. Isso é muito positivo. Se o João Paulo está no CNIG e na FPG ainda bem, pode dar-nos uma visão de questões que às vezes passam-nos despercebidas, fazer-nos alguns alertas que são bem-vindos. É óptimo. 

GT – A PGA de Portugal tem uma nova Direcção. Já houve contactos? 

NS – Eu abordei o Rui Morris. Nesta linha de juntarmo-nos duas vezes por ano com todas as organizações. A PGA de Portugal é uma delas. Encaramos a associação de profissionais como a de greenkeepers, a de gestores, a própria FPG. São parceiros com os quais queremos sentarmo-nos à mesa e percebermos onde podemos ajudar-nos uns aos outros, acima de tudo sem atropelarmo-nos. 

GT – Na altura da pandemia aquele documento que foi elaborado por todas as entidades ligadas ao golfe e enviado à administração central mostrou que é possível um trabalho conjunto entre todos. 

NS – Sempre que se fez alguma coisa em conjunto, foi sempre interessante. Quando cada um foi pelo seu pé, muito pouco aconteceu.    

GT – Após toda esta conversa, um pouco com temas soltos, mas importantes, vamos lá sistematizar e saber, ao certo, quais são os vectores mais importantes do programa que o CNIG deseja para estes próximos três anos? 

NS – Vamos ter uma reunião marcada para maio, onde iremos aprovar o plano de trabalhos. Vamos estabelecer onde queremos chegar e quando e vamos apresentar isso aos nossos associados. Mas tudo muito dentro desta linha. A água é um assunto importante, não tanto de um ponto de vista técnico, mas mais na questão da desburocratização. O IVA é um assunto em cima da mesa. O grande evento, os eventos, o apoio ao golfe é outra questão. A requalificação dos campos de golfe e o PRR, em linhas de financiamento possíveis também. Investir consideravelmente em estudos com entidades, empresas, universidades, credenciadas, para apoiarem o golfe em Portugal é fundamental. É nisso que queremos trabalhar, num alinhamento com todas as instituições que puxam pelo golfe. É obrigatório. Se conseguirmos isto, será um bom triénio.