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"Estou sempre à espera do absurdo, do patético"
19/10/2014 17:12 Rodrigo Cordoeiro
António Maia "cadastrado" no dia do lançamento do livro / © FILIPE GUERRA

António Maia fala sobre “The Longest Fore”, o livro de cartoons de golfe que acaba de lançar

A apresentação oficial do livro já tinha sido feita, quinta-feira última, quando me sentei a conversar um pouco com o seu autor, já noite, na esplanada do Centro Nacional de Formação de Golfe do Jamor, no Estádio Nacional, concelho de Oeiras. Estava curioso para saber mais coisas sobre António Maia e sobre o livro que acabara de lançar – “The Longest Fore”, uma colectânea de 51 cartoons de golfe. 

Fiquei assim a saber, por exemplo, que este não é o seu primeiro livro de cartoons de golfe: “Esqueci-me de dizê-lo há bocado”, começa por lamentar. “Publiquei em 2000 um livro de vinte e tal cartoons para uma pequena editora, que vendeu os 1000 exemplares de tiragem e depois faliu. A minha leitura é que eles não estavam preparados para aguentar o sucesso. Agora, 14 anos depois, volto com 51 cartoons.”

Fiquei também a saber que gostaria de lançar o livro – que tem título inglês e legendas bilingues (em português e inglês) – a nível internacional. “Acredito que consigo levá-lo para o estrangeiro”, confia. “Fiz de propósito um livro que qualquer golfista na China ou nos EUA pode comprar. Esta editora, a Alêtheia, é ideal, porque tanto pode tirar 20 exemplares como 20 mil. Espero dar o salto, porque este livro tem uma linguagem universal.”

Manuel Agrellos e Zita Seabra ladeiam autor após apresentação da obra / © FILIPE GUERRA

O humor está sempre presente no discurso de Maia. Na sua intervenção prévia, ladeado na mesa por Zita Seabra, da Alêtheia Editores, e Manuel Agrellos, presidente da Federação Portuguesa de Golfe, o cartoonista começara por agradecer ao staff  da Alêtheia o “risco”de lançar este livro, “risco” esse que passou a explicar. “O golfe não é assim muito popular nas editoras, calculo.” 

Agrellos lembrou que Maia, enquanto jovem, saltou por vários cursos universitários académicos, como sociologia, direito, história de arte, mas que os prazeres da vida não o deixaram terminar nenhum. “O golfe é uma auto-crítica constante. Eu nunca me chamei tantos nomes desde que fui para o golfe, nem bebi tanta água”, reconheceu o cartoonista, em outra das pérolas da sua intervenção.

Se a sua actividade como cartoonista profissional remonta a 1978, o golfe só entrou na sua vida muito mais tarde, em meados dos anos 90 do século passado. “Sentia que o golfe devia ser uma coisa óptima, tinha um tio que jogava. Só que ao pé de mim não havia nenhum campo, só o Vimeiro”, explica. Maia, de 63 anos, é natural de Rio Maior e é lá que tem vivido e trabalhado sempre, na localidade de Casais da Atagueda. 

Entretanto, em Julho de 1994, abriu em Rio Maior o campo hoje extinto do Golden Eagle. Maia fez-se imediatamente sócio e é daí que data a sua iniciação ao golfe. Neste clube, haveria de desempenhar as funções de vice-capitão, capitão e membro da direcção. “Teve um percurso trágico aquele campo, um dos melhores de Portugal. Pensava que um negócio com tamanha amplitude não fechasse, mas fechou”, lamenta.

 

Maia, um 16 de handicap que já foi 10, e que agora é sócio do clube sem campo do Xira Golfe, diz-se “meio perdido” com o encerramento do Golden Eagle: “Espero em Janeiro entrar num clube com campo. Royal Obidos, Bom Sucesso, Santo Estêvão… O Bom Sucesso também é um grande berbicacho. Espero que aguente, porque as pessoas tem casas à volta e não querem ali um matagal. Eu quando passo por detrás do Golden Eagle e vejo aquele matagal, com as bandeiras ainda nos buracos, só me apetece chorar.” 

Apesar de certos contratempos, o golfe é uma boa fonte de inspiração para cartoons? “O golfe tem um espírito especial, de autocrítica e de ironia, o que é perfeito. Contrariamente à política – os nossos políticos são todos fracos, levam-se muito a sério, e aí o sinal de inteligência desaparece. Quando eles fazem tanta asneira e se levam a sério, por amor de Deus… O golfe, por contraste, é uma coisa especial.” 

E poderá Maia, que colabora, em termos de golfe, com a Golf Digest Portugal, vir a publicar mais livros como este? “Sim, eu agora posso fazer outros 50 cartoons de golfe, não para o ano, para o outro. Para continuar. Dá-me imenso gozo. No fundo, retratar amigos meus, situações por que passamos. O golfe, além de criar amizades e companherismos, cria cumplicidades. Também permite conhecer melhor cada pessoa… Eu tenho uma teoria: quem faz batota no golfe faz no resto da vida.” 

Para Maia, “o cartoon é olharmos para a sociedade pela porta da cozinha em vez de ser pela porta da frente. Estamos sempre à espera do absurdo da situação, do patético. Já é um defeito profissional, o não levar as coisas a sério, e isso é saudável. Embrenhamo-nos em estupidezes no dia a dia, zangamo-nos imenso com coisas que não têm valor nenhum, cansamo-nos com isso. Temos de ter o talento para agarrar esses momentos, e traduzi-los depois em desenho.” 

“The Longest Fore” é o título do livro. Como referiu Manuel Agrellos na sua intervenção, “Fore” é uma palavra que traduz a aproximação de perigo no golfe, tendo origem nas legiões romanas. Neste caso concreto, traduz a abordagem ao humor de cariz universal focado num desporto não tão universal quanto isso, de um grande artista português. Disse Manuel Agrellos: “O autor mostra-nos sem dúvida o seu grande talento humorístico, a sua grande paixão por este desporto, com cartoons que tenho a certeza vão provocar em todos os golfistas que o lerem enormes gargalhadas”

Nós confirmamos: é um grande livro de golfe.