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Patrick Reed e o politicamente correcto
12/11/2014 12:25 Tomás Moreno
Patrick Reed / © GETTY IMAGES

Tudo o que não queremos são discursos mornos e assépticos, escreve Tomás Moreno

O golfe tem evoluído muito nos últimos anos. Não se pode dizer que os tempos em que a modalidade era sinónimo de “rich white men” tenha passado por completo mas importantes passos foram dados nesse sentido. Um dos exemplos mais visíveis desta realidade é que as grandes mecas do golfe e derradeiros bastiões de uma tradição há muito desalinhada com a sociedade mudaram a sua política relativamente a proibição de sócios do sexo feminino. 

Em Agosto de 2012 o Augusta National Golf Club anunciou a entrada de duas novas sócias: Condoleeza Rice, ex-Secretária de Estado norte-americana e Darla Moore, uma financeira da Carolina do Sul que havia sido capa da Fortune Magazine. Em Setembro do presente ano, o Royal and Ancient Golf Club of St. Andrews seguiu o mote e ao fim de 260 anos de existência também abriu as portas a mulheres. 

Estes são passos marcantes na essencial batalha pela democratização do golfe. Verdade seja dita que em Portugal, por razões diversas, não se verificaram os problemas de segregação racial, religiosa e étnica tão discutidos nos Estados Unidos. Mas o trilhar desta importante democratização deve ser acompanhado com atenção e quando necessário as batalhas devem ser travadas com vigor e sem hesitação. 

Mas tudo o que é demais faz mal e no caso da celeuma que estalou à volta de Patrick Reed pode até ser prejudicial. Quem já jogou golfe sabe o que é a frustração de fazer três putts e atire a primeira pedra quem nunca se insultou a si mesmo depois de uma tacada menos feliz. Ora, no WGC-HSBC Champions, que terminou no último domingo, um microfone captou Patrick Reed a dizer para si mesmo: “Nice f**king three-putt you f**king fag*ot.” 

A PGA tem regras sobre linguagem obscena e Reed será certamente alvo de um inquérito. Mas o que está a aquecer os fóruns não são os palavrões mas sim o empregar de uma palavra tipicamente utilizada para referir homens homossexuais de forma depreciativa. Ninguém contesta que a escolha de palavras foi errada mas a verdade é que o homem estava a falar consigo mesmo. Não conheço Patrick Reed pessoalmente mas contrariamente ao que alguns querem fazer crer duvido que se tenha exposto aqui uma cabala contra os homossexuais no golfe. 

Como profissional que é, Reed deveria saber que as figuras públicas são altamente escrutinadas e que quando está a jogar tudo pode ser gravado. Daí o inquérito da PGA que provavelmente resultará numa multa. Mas os temas devem ser mantidos no seu contexto e não utilizados como bandeiras para retirar conclusões desajustadas ou avançar agendas políticas. Reed errou porque, como modelo que é para as gerações mais novas, não deve praguejar. Aliás, este assumiu imediatamente o erro ao pedir desculpas públicas quando terminou a volta e lhe referiram o que tinha dito. Segundo ele, nem se lembrava das palavras que tinha usado. Problema identificado, problema endereçado – fim de história, desde que não se repita. 

Quando estes episódios ganham notoriedade perdem, por um lado, aqueles que tentam avançar questões com mérito, porque lhes é retirado tempo de antena. E perdem por outro lado os fãs e a modalidade porque todos os profissionais de golfe terão visto que para se protegerem têm de bloquear as suas emoções. 

Em 2014 Patrick Reed foi saudável tema de conversa pelos fairways e club houses deste mundo fora precisamente por falar e agir a quente. Uns acharam que ele tinha sido convencido quando, no início da temporada, se autoproclamou um dos 5 melhores jogadores do momento. Outros diziam que é precisamente essa a atitude que um vencedor deve ter. 

Durante a Ryder Cup, Reed não só foi um dos melhores jogadores da equipa americana como voltou a mostrar a sua garra ao mandar calar os adeptos europeus que o vinham vaiando. Com um pequeno gesto de “shiu”, Reed ganhou os corações dos americanos e a antipatia dos europeus. São estes episódios que deixam os adeptos a falar durante semanas e que geram drama numa modalidade que quando comparada com outras tem necessariamente menos acção. 

Esperemos que os jornalistas e as publicações de referência que atiçaram as chamas deste recente faits divers não venham a queixar-se que Patrick Reed tal como Tiger Woods e tantos outros se tornou frio e demasiado politicamente correcto – repetindo um discurso morno, asséptico e sem qualquer interesse que por não dizer nada o protege de tudo.