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Especialização precoce no golfe? Qual a justificação?
Crónica
20/01/2016 10:31 José Pedro Almeida

Um desporto para a vida necessita de regras específicas na formação de jovens atletas

Como fisiologista das seleções nacionais de golfe, tenho tido o privilégio de observar e avaliar jovens golfistas de todas as idades e de todas as zonas do continente e ilhas, ao longo de alguns anos. 

Neste momento, tenho a capacidade de caracterizar fisicamente o jovem golfista português, quais as grandes lacunas, as maiores limitações e prever as possíveis lesões – aspetos a desenvolver em crónicas futuras. Não porque tenho algum dom, mas porque todos estes aspetos do desenvolvimento atlético dos jovens já são estudados há muito tempo e fazem parte da formação de qualquer profissional licenciado em Ciências do Desporto. De fato, a criação de equipas multidisciplinares são fundamentais, tem muitas vantagens, mas vão trazendo alguns receios aqueles que não se vão preocupando com a sua formação técnica de base e posteriormente o seu desenvolvimento contínuo. Neste momento do conhecimento, vamos assistindo, ainda, a profissionais a tentar dominar todas as áreas. Áreas tão específicas como a condição física, a psicologia e às vezes até a fisioterapia!! 

Infelizmente, falo por experiência própria, neste meu percurso ao mais alto nível do golfe nacional. Neste sentido, desafio-o a si, caro leitor, a um exercício básico; o percurso de um profissional em condição física tem uma formação base média de 5 anos de licenciatura – onde estuda áreas como a anatomia, fisiologia do esforço, desenvolvimento motor e atlético, metodologia do treino, entre outras – e continua pela sua formação pós graduada em mestrados e doutoramentos, e se quiserem fazer uma especialização em golfe, fazem diversas certificações profissionais em Fitness para Golfe, desenvolvidas pelas organizações mais credíveis no mundo do golfe e que também certifica os profissionais que acompanham os melhores jogadores do Tour. Tendo isto em conta, conseguimos perceber que a fasquia tem que subir muito para todos os outros elementos que fazem parte dessa mesma equipa multidisciplinar e ainda mais para quem a lidera.

Tendo isto em conta, conseguimos perceber que a fasquia tem que subir muito para todos os outros elementos que fazem parte dessa mesma equipa multidisciplinar e ainda mais para quem a lidera. 

Resultado final:

  • Uns têm coragem para liderar uma equipa técnica com um nível de conhecimento elevado, e o trabalho desenvolvido tem resultados visíveis e quantificáveis 
  • Uns não têm coragem, nem vontade para crescer e fazer parte de uma equipa técnica, e fazem tudo como faziam quando eram jogadores
  • Outros , conscientemente, já sabem tudo, porque ouviram algumas coisas de todas as áreas e não sentem a necessidade de construir uma equipa técnica 

Tudo isto leva-me ao tema desta crónica a especialização precoce dos jovens golfistas, que na minha opinião só tem acontecido e continuará a acontecer por falta de formação dos profissionais que lideram as equipas multidisciplinares e os processos de treino dos mesmas. 

Se existem alguns desportos que necessitam esta especialização precoce para atingir um nível de elite, como a ginástica ou a natação, este não é o caso do golfe. O golfe é um desporto para a vida e necessita de um conjunto de regras específicas quando falamos da formação de jovens atletas. 

Afinal quais são as consequências potenciais desta especialização precoce no golfe?

  1.       A participação num único desporto numa idade precoce limita o desenvolvimento da técnica e da velocidade
  2.       Os atletas podem preencher algumas lacunas de habilidades motoras básicas ao praticarem outros desportos
  3.       Treinos de alta intensidade ou volume num único desporto podem aumentar o risco de lesão e podem atrasar o desenvolvimento físico
  4.       O aumento de pressão para o sucesso em idades mais precoces podem resultar em stress psicológico e tornar o golfe uma atividade menos agradável
  5.       Isolamento social, devido a uma limitada interação com crianças da mesma idade 

Além destas potenciais consequências, sabemos, também, que a criação de atalhos na formação desportiva do jovem atleta leva a um conjunto de praticas menos conseguidas, com consequências, objetivas e limitantes, como mostro no quadro seguinte:

ATALHOS  CONSEQUÊNCIAS
Golfistas “over-compete” e “under-train” Maus hábitos desenvolvidos por muita competição, onde o único objectivo é ganhar
Calendários competitivos e programas de treino para adultos, impostos a atletas em desenvolvimento Skills subdesenvolvidos devido a programas de treino inapropriados
Desenvolvimento cronológico em vez do biológico é usado no planeamento do treino e das competições Programas remediados, para acompanhar os atalhos da preparação dos atletas
A maioria dos profissionais negligencia os períodos críticos de adaptação acelerada ao treino  O potencial atlético não é atingido
Os pais não são educados no desenvolvimento atlético a longo prazo Os jogadores são “puxados” em diferentes direcções, sentem-se perdidos
Na maioria das vezes o calendário competitivo interfere com o desenvolvimento do atleta Deficientes habilidades motoras base, comprometem o desenvolvimento a longo prazo – especialização precoce.

E nós como pais estamos a alimentar esta especialização precoce? Sim estamos!

Mas existem um conjunto de fatores que nos fazem seguir esse caminho. 

  1. A comercialização deste desporto através da glorificação de atletas e do seu estilo de vida. Todos nós sabemos isto, mas quantos pais falam comigo, que desejam que os seus filhos sejam o próximo, Jordan Spieth, Rory ou Tiger Woods.
  2. Como pais queremos proporcionar as melhores oportunidades aos nossos filhos, com os melhores treinadores, o melhor equipamento, nos melhores campos. Por vezes transportamos os nossos sonhos que não realizamos para as prestações deles, o que não é o mais justo. 

Neste momento o golfe nacional já tem alguns bons exemplos, assim como menos bons exemplos. O que nos ajuda a entender como esta é uma problemática a ter em conta. 

Na minha opinião, penso que o melhor conselho é que devemos procurar: 

  •         Profissionais que tem investido na sua formação continua, como acontece nas diferentes áreas profissionais.
  •         Clubes que construíram uma escola de formação de jovens estruturada, com profissionais certificados e habilitados para formar jovens atletas 

Sempre acreditando no principio, de que a formação, dá mais habilitações para poderem desenvolver  um trabalho de melhor qualidade. Para isso basta, pedir as habilitações profissionais dos responsáveis pelas aulas, que devem ser públicas e que para a manutenção da cédula de treinador é, legalmente, atualizada periodicamente, no organismo da tutela.

Saudações desportivas.

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Fisiologista do Exercício

Certificado pela Nike golfe como Golf Performance Specialist

Certificado pelo Titleist Performance Institute como Certified Golfe Fitnes Instructor e Junior Coach

Certificado pela National Strength & Conditioning Association como Especialista em Treino da Força

Professor Universitário na Faculdade de Motricidade Humana durante 13 anos

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