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"O meu olhar é de fora para dentro"
12/09/2016 17:32 RODRIGO CORDOEIRO
Luís Filipe Pereira fotografado a 3 de Setembro na entrada da clubhouse do Belas Clube do Campo. Era sábado por volta do meio-dia e tinha acabado de fazer 18 buracos sob um calor demolidor / © RODRIGO CORDOEIRO

Figura pública, Luís Filipe Pereira puxa dos seus galões para eleições na FPG

Esta entrevista com Luís Filipe Pereira foi publicada no oitavo número do suplemento de golfe do GolfTattoo no jornal Público, no passado sábado, 10 de Setembro. Nela, reconhece que foi desafiado para, com o seu prestígio e currículo (por exemplo, ainda preside ao CES, Conselho Económico e Social), encabeçar uma lista às eleições na Federação Portuguesa de Golfe (deverão realizar-se no final de Outubro) que servisse de ruptura com o governo de Manuel Agrellos (na presidência desde 1999), sublinhando o “divórcio entre a generalidade da população e o golfe” e a estagnação do número de filiados na FPG. Naturalmente, Luís Filipe Pereira, de 71 anos, só poderia estar contra aquele que foi o seu secretário-geral desde 2011, Miguel Franco de Sousa, o seu adversário na corrida eleitoral.

GOLFTATTOO – Não consta que seja um especialista de golfe, o que é que o levou a avançar para este projecto? 

LUÍS FILIPE PEREIRA – Bom, quando me desafiaram para este projecto, informei-me e constatei que o golfe em Portugal é de uma completa estagnação. Temos o mesmo número de jogadores de há 10 anos. O golfe está fechado sobre si mesmo, sem conseguir entrosar-se com a população. Para a generalidade é um hobbie para ricos e para velhos, quando, ao contrário, é um desporto saudável que deve ser acessível a largos estratos da população portuguesa.

O divórcio entre a generalidade da população e o golfe é tal, que mesmo a comunicação social não deu qualquer relevo à participação, pela primeira vez, de golfistas portugueses no maior acontecimento desportivo a nível mundial – os Jogos Olímpicos.

Pensei que seria interessante modificar ou contribuir para modificar esta situação. O meu olhar é um olhar de fora para dentro.

É evidente que o simples facto de uma nova candidatura afirmar que vai “fazer diferente” e ter resultados não é garantia que o faça. Quando falamos do futuro é legítimo que alguns duvidem. Mas o que não é legítimo é duvidar do que se passou no passado e da situação em que nos encontramos, porque essa é inequívoca: os números estão aí para o confirmar.

No entanto, se me é permitido apontar alguns factos de ordem pessoal que podem ajudar a dar algum suporte a esta afirmação de que vamos “fazer diferente” e obter resultados, diria brevemente que tenho mais de 35 anos de experiência profissional, como gestor a alto nível, em grandes empresas, como CEO ou Presidente do CA (sempre com resultados apresentados), 20 anos de docência universitária (responsável pela cadeira de Estratégia Empresarial na Universidade – ISCTE) e 10 anos de desempenho dos cargos de Secretário de Estado e de Ministro, com desempenho escrutinado a nível público.

A equipa que está comigo são pessoas oriundas dos clubes de golfe e dos membros institucionais com experiência de gestão nos respectivos clubes e com conhecimentos adequados da realidade do golfe nacional e das diferentes áreas de responsabilidade da FPG. 

Quem é que o desafiou a avançar? André Jordan terá sido um deles… 

Houve várias personalidades e entidades… não vou dizer quais. Falaram comigo porque eu poderia ter condições de coordenar equipas, para atingir resultados. Parece-me que este é o aspecto mais importante. Também, já agora, a facilidade que me é dada em falar com entidades oficiais, com o mundo das empresas. 

A sua vida profissional é bastante ocupada, ainda lhe permite ter tempo para dar à Federação Portuguesa de Golfe? Pergunto isto porque, em contraponto, o seu concorrente nas eleições e actual secretário-geral, Miguel Franco de Sousa, defende a profissionalização do cargo de presidente. 

Sim, aliás eu estou a sair de presidente do Conselho Económico e Social, comprometi-me com os dois principais partidos políticos a assegurar esta função até ser eleito um novo presidente, o que ainda não foi possível.

Obviamente, acho que é importante ter uma presidência, uma direcção e um secretário-geral. Acabar com o secretário-geral, centralizar tudo no presidente, como parece que é ideia da outra candidatura, julgo que é meramente por razões pecuniárias e financeiras. Não me parece que a organização de uma federação possa estar condicionada por preocupações do candidato em ter um vencimento e centralizar tudo nele.

Aliás, considero que Miguel Franco de Sousa, encabeçando uma lista, não devia manter-se no posto que ocupa, porque ambas as candidaturas deviam ter as mesmas condições para poderem adiantar os seus argumentos e, mantendo-se ele na federação, tem os meios para ter maior facilidade de acesso, por exemplo, aos delegados. “À mulher de César não basta ser séria, tem de parecer séria”. Mas não estou interessado neste tipo de argumentos, antes nos aspectos de estratégia. 

Não é só em Portugal que o golfe está estagnado, é um por pouco todo o mundo, com algumas excepções. Em alguns países tem até decrescido. 

É evidente que vivemos uma situação de crise, e essa é uma razão que pode ser apontada, mas quando comparamos a situação do golfe em Portugal com a de outros países (que também sofreram com a crise) constatamos, por exemplo, que Portugal tem cerca de 3,5 vezes menos jogadores do que a República Checa, onde não é possível jogar vários meses por ano, ao contrário de Portugal, em que, de um modo geral, é possível jogar golfe todo o ano. E isto para não referir o caso dos países nórdicos (Dinamarca, Finlândia e Noruega, com populações até menores que Portugal), que têm oito a dez vezes mais jogadores do que em Portugal. 

O golfe na República Checa desenvolveu-se através de infra-estruturas que são campos de 9 buracos/driving ranges. Portugal tem um parque desportivo de golfe que não está vocacionado para o desenvolvimento da modalidade. 

Exactamente – e essa é uma situação que tem que se modificar. É evidente que a federação não nada em dinheiro. Mas eu estou habituado a gerir recursos limitados em termos profissionais – e acho que é possível criar infra-estruturas não sofisticadas que permitam pôr pessoas mesmo com baixos níveis de rendimentos a jogar golfe. Lugares onde se possam bater bolas, campos rústicos, por exemplo. É igualmente possível fazer uma bolsa nacional de tacos usados e distribuir esses tacos, criar com as autarquias a possibilidade de as escolas terem horários nos campos para que nas horas mortas possam praticar. É preciso é fazer. Não basta falar. É preciso democratizar o golfe, levá-lo a mais extractos da população. 

Diz que o golfe português está fechado sobre si mesmo. Como é que é possível abri-lo à população, além das “infra-estruturas não sofisticadas” de que falou? 

A formação é decisiva para o crescimento do golfe e por isso necessitamos de uma estratégia integrada que articule modelos de ensino, apoio aos clubes, condições para os formadores, avaliação efectiva, e que conduza a resultados. O Centro Nacional de Formação de Golfe do Jamor foi um investimento na formação, embora se possa deixar a interrogação se os recursos obtidos do Estado não seriam mais reproduzidos estrategicamente (em termos de resultados) se aplicados em todo o país e não apenas num grande Centro em Lisboa.

Foi feita alguma coisa pela formação, mas a situação “pura e dura” é aquela que atrás descrevo. Ou seja, não há resultados concretos, palpáveis, que traduzam, ou sequer apontem, para uma modificação significativa daquela (ainda que mínima e progressivamente). E esta realidade está também, ao fim e ao cabo, na origem da nossa situação na alta competição e no profissionalismo: sem crescimento sustentado do número de jogadores amadores, sem o alargamento da “pirâmide”, não se conseguem obter, de forma sustentada e duradoura, resultados na alta competição amadora e na competição profissional. E também sem crescimento, a comunidade do golfe – clubes, profissionais, árbitros, treinadores – está também condenada à situação sem perspectivas de futuro em que hoje vivemos. 

Como tem decorrido a campanha? Está confiante que vai ganhar? 

Naturalmente que não aceitei este desafio para o perder. Estou confiante de que grande parte da comunidade do golfe é sensível à questão essencial: há que modificar a situação actual do golfe em Portugal e para isso é indispensável introduzir alterações profundas na estratégia e no comportamento da FPG. Não é com as pessoas que estão à frente dos destinos dela há longos anos e responsáveis pela inexistência de resultados, que é possível “dar a volta” ao estado em que o golfe se encontra. De facto, tiveram esses longos anos para atingir resultados e não o fizeram, pelo que me parece legítimo dizer que da outra candidatura só podemos esperar mais do mesmo.

Divulgarei brevemente o Programa da minha candidatura e anunciarei formalmente a equipa que está comigo e que constituirá a Direcção da FPG se formos eleitos. A partir daí, julgo que “a comunidade do golfe” poderá avaliar melhor aquilo que nos propomos fazer. 

Se ganhar as eleições, conta com Miguel Franco de Sousa para secretário-geral? 

O actual secretário-geral encabeça a lista concorrente que, em termos programáticos, não partilha a minha posição sobre a situação actual do golfe em Portugal nem a estratégia que defendo. Deste modo creio que não faz sentido colocar a hipótese a sua manutenção se a minha candidatura for eleita. Não é uma questão pessoal, mas sim de diferença de estratégia.