João Carlota, nº1 amador português em 2014, na sua primeira entrevista como profissional
Desde pequenino que João Carlota, natural de Faro e residente em Vilamoura, sonha com ser jogador profissional de golfe. Esse momento chegou. O algarvio do Clube de Golfe de Vilamoura, de 24 anos, acaba de abandonar o estatuto amador, na sequência de uma época em que se sagrou, pela primeira vez, nº1 no Ranking Nacional BPI. Motivo mais do que suficiente para a sua primeira grande entrevista na condição de "pro".
GOLFTATTOO – Jogaste na semana passada o teu primeiro torneio na condição de profissional, por ocasião do Palmares Classic, do Algarve Pro Golf Tour, organizado pela PGA de Portugal em parceria com o Jamega Tour. Que tal foi a sensação de jogares sob um novo estatuto?
JOÃO CARLOTA – Foi bom. Estou a atravessar uma nova etapa na minha vida, na minha carreira como golfista, e começo agora a trabalhar em certos e determinados aspectos que requerem mais atenção. O meu jogo não está ainda a 100 por cento, tenho andado a fazer umas alterações no meu swing, para me preparar para época de 2015. Também por isso o resultado não foi o esperado.
Que alterações são essas?
Transferência de peso. O balanço do meu swing estava um bocadinho instável. Ando a trabalhar ao nível da estabilidade, da cintura para baixo, para no futuro ficar mais sólido e resistente.
Quando decidiste fazer essas alterações?
Já há uns bons meses que tinha falado nisso com o Nuno Campino [treinador e seleccionador nacional da Federação Portuguesa de Golfe] e com o meu treinador, o Joaquim Sequeira. Porque, como tenho um swing com uma potência maior do que o normal, muito mais rápido e explosivo, e que requer mais consistência e solidez da cintura para baixo, precisava de consolidar o ritmo do meu movimento.
Daí os resultados recentes não terem sido os melhores. Fizeste 79-71 no Palmares Classic e no início de Novembro, no teu último torneio como amador, tinhas feito 77-78 no 6º Torneio do Circuito Liberty Seguros, no Aroeira 2.
O Liberty já foi uma consequência de ter começado as alterações, e também a nível emocional não estava da melhor maneira [devido à morte de um primo num acidente de viação], mas já estou recuperado neste aspecto e continuo a trabalhar em termos técnicos. Já fiz uma boa segunda volta no Palmares Classic e a seguir fui treinar e já me senti melhor nos aspectos que tenho estado a trabalhar. Acho que vai correr tudo bem nos próximos torneios do Jamega Tour. Tenho mais 5 ou 6 torneios até ao final do ano. Dá-me rodagem, ritmo, para avaliar todos os capítulos do meu jogo antes de 2015.
Com Nuno Campino a caddie na Escola de Qualificação em Ribagolfe / © FILIPE GUERRA
Preocupas-te com a condição física?
Sim, tenho-me focado agora mais pormenorizadamente na área da flexibilidade.
Já há muito tempo que querias ser profissional de golfe?
Sim, desde pequenino, desde que comecei a jogar golfe, sempre ambicionei ser profissional de golfe. Acho que todo o trabalho que tenho feito tem vindo a aparecer, tendo em conta os resultados obtidos ao longo dos anos. Cada vez estou mais maduro como jogador. Claro que agora, como jogador profissional, é uma fase diferente, estou a jogar por dinheiro, e a nível psicológico, ao início, é normal que afecte um bocadinho, por mais que estejamos habituados a jogar ao mais alto nível. A responsabilidade acaba por ser maior. Mas é tudo uma questão de tempo e hábito para nos sentirmos confortáveis e para isso tenho trabalhado e vou continuar a trabalhar.
Continuas a trabalhar na Oceânico Golf?
Não, neste momento sou jogador profissional de golfe apoiado pela Oceânico, mas já não estou a trabalhar lá. Estive três anos como caddie-master e como assistente de greenkeeper.
E tens os apoios necessários que te permitam não trabalhar?
Neste momento, os apoios são relativos. Para já tenho uma pessoa que me ajuda nas inscrições dos torneios. A Oceânico apoia-me para já no que é necessário para ser profissional, ao nível de prática e facilidades.
O ensino de golfe não está nas tuas cogitações?
Se por acaso parecer, não prescindo, seria uma mais-valia para mim também como profissional de golfe. Mas estou focado em ser jogador e não no ensino.
Contas jogar para o ano algumas provas do Challenge Tour?
Ando a trabalhar para conseguir alguns convites para o Challenge Tour, através da PGA de Portugal ou de outros sponsors que consiga arranjar. Para que através desses torneios consiga uma categoria que me dê acesso à época de 2016. Jogarei ainda os torneios da PGA Portugal e alguns outros. O meu objectivo é chegar, mais tarde ou mais cedo, ao European Tour.
No Nacional de Clubes 2014, em equipa com Nathan Brader (de costas) / © FILIPE GUERRA
Estiveste na Irlanda a estudar cerca de três anos, voltaste para Portugal sem ter o curso feito. Consideras que foi a decisão certa?
Fui para a Irlanda em 2008, voltei no final de 2011. Conclui o segundo ano do curso de Business & Management, na universidade de Maynooth. Faltava-me precisamente um ano para acabar o curso, mas eu estava a sentir que podia acabar o curso em qualquer altura da minha vida, e que teria de apostar no golfe mais a sério e imediatamente se quisesse seguir no futuro uma carreira profissional na modalidade. Na Irlanda o meu golfe não estava a 100 por cento devido aos estudos, estava a 60 por cento, se tanto. Mas foi uma mais-valia para mim ter estado lá, porque aprendi muitas coisas.
Como foi essa experiência na Irlanda em termos de golfe?
Tínhamos um circuito a nível universitário relativamente bom. Não era nada comparado com o circuito universitário dos Estados Unidos, o que também se compreende pelo tempo que faz na Irlanda, e que muitas vezes impede a prática e o treino. Estava com dificuldades em conciliar os estudos com o golfe, mas também as más condições climáticas não me deixavam treinar o tempo de que precisava para chegar ao nível por mim desejado.
Mas ainda brilhaste ao serviço de Maynooth contribuindo para a vitória no Campeonato da Europa Universitário no Algarve.
Bati o recorde do campo de Vale da Pinta com 8 abaixo do par na última volta. Lembro-me que estávamos atrás e acabámos por ganhar com 5 de vantagem. Mas desde que vim da Irlanda, todos os anos têm sido positivos. No primeiro ano, em 2012, não estava ainda muito rodado, tive de trabalhar arduamente para conseguir voltar a consolidar o meu jogo, mas ainda assim apresentei alguns resultados, fui vice-campeão nacional absoluto. Em 2013, passei o cut no Open da Madeira, fiquei em 9º no Internacional de Portugal e em 11º no Campeonato da Europa Individual e fui campeão da Europa de clubes por Vilamoura. Ano após ano os resultados têm vindo a melhorar. Este ano foi o meu melhor de sempre, bati um recorde nacional no Campeonato do Mundo, fiquei nos 32 melhores no British Amateur entre mais de 250 jogadores e no St. Andrews Trophy fui considerado o segundo melhor jogador da equipa da Europa Continental. Também fui vice-campeão nacional e campeão nacional de clubes por Vilamoura pelo terceiro ano seguido.
Vieste da Irlanda e acabaste por jogar dois Campeonatos do Mundo por Equipas, o Troféu Eisenhower, coisa de que raros jogadores se podem orgulhar. No último, em Setembro, no Japão, tornaste-te o primeiro português a jogar três voltas abaixo das 70…
Foi muito bom para mim, uma experiência espectacular.
Carlota jogou na semana passada o seu primeiro torneio como "pro" / © FILIPE GUERRA
Costumas treinar sozinho?
Treino muito sozinho. Quando preciso do auxílio do meu treinador, o Joaquim Sequeira, entro em contato com ele. Ele tem estado sempre disponível, há que louvar o trabalho dele, é o melhor treinador que eu poderia ter arranjado. Não só treinador, amigo também. O Nuno Campino, o trabalho que ele tem feito comigo também é de louvar, não só a nível técnico mas estratégico. Quando chegamos a um nível muito alto, sabemos bater na bola, meter a bola no buraco, mas a nível táctivo e estratégico há que saber jogar golfe, e o Nuno ensinou-muito nesse aspecto.
O Nuno Campino fez aliás de teu caddie num dos torneios da primeira fase da Escola de Qualificação do European Tour, aquele que se jogou em Portugal, mais concretamente em Ribagolfe. Era uma prova em que apostavas forte, inclusivamente deixaste de jogar a Taça da Federação, um dos dois majors do golfe nacional amador, porque se realizava em cima da Escola. Mas entraste em campo com uma valente gripo e com febre… Falhaste o apuramento por uma pancada… Achas que se não fosse a gripe terias passado?
É difícil responder. Eu creio que sim. Mas, tendo gripe ou não, foi aquilo que se passou... O ano passado tinha falhado por 3, este ano falhei por 1… É difícil de digerir quando uma pessoa falha uma etapa daquelas por 1 pancada, mas só há que aprender e guardar as emoções que tive naqueles 4 dias, para que uma próxima vez em que isso aconteça esteja preparado e saiba como responder. Para estar preparado para lidar com situações semelhantes.
Tal como aconteceu com o Ricardo Santos, que esteve estes últimos três anos a jogar no European Tour, passaste a profissional sem vencer o Campeonato Nacional ou a Taça…
Isso é relativo. Fui duas vezes vice-campeão nacional. Quando tiver de ganhar, hei-de ganhar. Ainda não chegou a minha altura, Vou continuar a trabalhar arduamente e melhor para que nesta minha fase como jogador profissional venham as tantas vitórias pelas quais anseio.
Supreendeu-te o ascensão meteórica de Ricardo Melo Gouveia como profissional? Ele deixou o estatuto amador em Julho e entretanto já venceu no Challenge Tour, tendo ficado muito perto de conseguir o acesso ao European Tour via Escola de Qualificação.
Sabemos que o Ricardo Melo Gouveia tem trabalhado muito nos últimos anos e isto que está acontecer é fruto do seu trabalho. Acho que ninguém mais do que ele merece viver este grande momento de forma que está a viver.
O Pedro Figueiredo não está a ter o mesmo sucesso desde que se tornou profissional o ano passado.
O Pedro é um grande jogador que vai dar grandes cartas, já como amador foi dos melhores de sempre. Sempre foi muito trabalhador e dedicado e é uma questão de tempo até os resultados aparecerem.
Como viste esta época menos bem sucedida do Ricardo Santos no European Tour?
O Ricardo Santos é um jogador imprevisível, no bom sentido. Pode trazer-nos alegrias em qualquer momento quando menos esperado. É muito talentoso. Todos os jogadores têm más fases. O Ricardo está a atravessar uma fase menos boa, mas acho que tem trabalhado muito e feito um grande esforço para chegar onde chegou.
Certamente que gostarias de te ter despedido com a revalidação do título no European Men’s Club Trophy, o Campeonato da Europa de Clubes, no qual Vilamoura defendia o título conquistado o ano passado no Aroeira 1. A prova na Bulgária, em Outubro, ficou reduzida a uma volta e Vilamoura foi vice-campeão…
Foi um título de vice-campeão menos bom, amargo. Mas acho que saímos de cabeça erguida, com a consciência de que podíamos ter trazido o título de campeões para casa. O mau tempo não o permitiu.
E que dizes de Vítor Lopes, de 18 anos, o teu ex-companheiro de equipa, e uma das actuais sensações do golfe amador português, vencedor da Taça da Federação Portuguesa de Golfe e também com resultados de destaque a nível nacional?
Desde Junho que foi sempre a subir para ele – e acho que vai continuar a subir. É um jogador que apresenta grandes capacidades, em todos os aspectos. Tem de melhorar um bocadinho o jogo curto mas ele sabe disso melhor do que ninguém. Por isso acho que é um jogador com grande potencial. Para mim é já o melhor jogador a nível nacional amador.
O Vítor Lopes merecia ter sido um dos três portugueses convocados para o último Campeonato do Mundo?
O Nuno Campino fez a opção certa, porque ao nível dos rankings o Gonçalo Costa era o que merecia ir. Acho que Gonçalo fez um campeonato positivo, tendo em conta a má fase que estava a atravessar. O Gonçalo é mais maduro do que o Vítor, tem mais experiência internacional, e não se sabe se o Vítor teria tido melhor desempenho. Além disso, o Nuno não podia levar o Vítor porque precisava dele Campeonato da Europa por Equipa de Sub-18, que se começava a jogar já em cima do fim do Campeonato do Mundo.