Miguel Angel Jiménez não é um seguidor das boas práticas que explicarão o sucesso dos mais idosos
Cerca das 13 horas de quarta-feira dia 31 de Março de 2004, os adeptos que ladeavam o fairway do último buraco do campo de golfe da Penina para assistir à chegada dos grupos do Pro-Am do Open de Portugal depararam com uma cena insólita. Um conhecido profissional da modalidade, facilmente reconhecido pela sua cabeleira ruiva apanhada num rabo-de-cavalo farfalhudo e por uma assinalável barriguinha, preparava a tacada de aproximação ao green. Perante mais uma tacada incompetente de um amador da sua equipa a quem já tinha dado dicas nas duas vezes anteriores em que tinham jogado juntos, ele decide insistir. Começa por flectir os joelhos colocando-se praticamente de cócoras, levanta os braços para o céu, vira as palmas das mãos para a frente, roda o torso repetidamente para a esquerda e para a direita e intima: “Rueda Mário”, “Rueda Mário”, “Rueda Mário”... O inepto amador não era senão este vosso cronista e o profissional o célebre Miguel Angel Jiménez. Ainda hoje, sempre que executo uma má tacada na companhia dum amigo que presenciou a cena, ele presenteia-me com uma récita do mantra “Rueda Mário”.
Na altura da cena acima descrita, Miguel Ângelo já completara quarenta anos de idade mas continuava a ser senhor de um jogo temível. Não propriamente por bater a bola a distâncias quilométricas como a maioria dos demais parceiros de profissão, mas por averbar quase sempre menos pancadas do que eles. O que aconteceu precisamente no Open de Portugal desse ano, que ganhou com grande autoridade. Para celebrar o triunfo sacou de um longo e grosso charuto donde expeliu grandes baforadas, numa atitude que é desde há muito uma das suas idiossincrasias mais conhecidas.
De então para cá à vitória no Open da Penina foi adicionando outros triunfos nos circuitos internacionais. E no ano corrente comemorou meio século de vida vencendo uma prova do circuito maior da Europa, feito inédito na história do circuito! Não será difícil adivinhar que se os tours principais não limitassem fortemente o acesso aos veteranos com mais de 50 anos (se bem me recordo só poderão jogar 7 ou 8 torneios por ano) ele seria capaz de repetir mais vezes a façanha.
Sendo certamente um caso singular, M. A. Jiménez está porém muito acompanhado na galeria dos profissionais com longevas carreiras competitivas. Ernie Els, Fred Couples, Angel Cabrera, são alguns dos muitos quarentões que deram – e continuam a dar – renhida luta aos mais jovens jogadores dos circuitos mundiais. E não raro ganham torneios, mesmo os majors, como Darren Clark o fez aos 42 anos quando venceu o Open Britânico! A propósito, recorde-se a dificuldade que os selecionados europeus da recente Ryder Cup tiveram em desenvencilhar-se dos americanos Jim Furyk e Phil Mickelson, ambos há muito entrados na casa dos quarenta!
Que razões explicam o surgimento de tantos profissionais veteranos que levam de vencida os jogadores muito mais jovens? Além de fatores demográficos, os especialistas apontam as tendências atuais de hábitos alimentares saudáveis; treino físico assíduo; permanente aconselhamento psicológico; melhor gestão dos percursos; potenciação do jogo à roda dos greens; etc.
Miguel Angel Jiménez não é propriamente um seguidor das boas práticas que porventura explicarão o sucesso dos mais idosos. É um bom garfo, não se coíbe de beber copos por vezes imoderadamente, e não é visita frequente de ginásios. Neste último pormenor, limita-se a fazer ocasionalmente uns estiramentos baseados na cómica postura assumida no Pro-Am acima descrito. A que é que Jimenez atribui a sua longevidade competitiva? Segundo o que o próprio me disse, ao fato de ser um homem naturalmente alegre, feliz pela profissão que tem e pelas boas coisas que ela proporciona. Num registo ligeiramente diferente, mas convergente, dois profissionais espanhóis do tour europeu explicaram recentemente a um grupo de praticantes portugueses onde eu estava incluído que ele tem uma auto estima que roça o narcisismo!
Nos exercícios de aquecimento do meu próximo torneio vou tentar colocar-me de cócoras e daí fazer estiramentos. Durante o jogo tentarei ainda responder com alegria e felicidade às más tacadas que der. E, se a fórmula resultar na vitória, tirar do saco um grande charuto!
___________________________________________________
Presidente da Federação Portuguesa de Golfe de 1984 a 1999