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À procura de soluções
Crónica

Como em qualquer outra indústria há problemas recorrentes no golfe cuja causa é mais ou menos conhecida, mas não está taxativamente identificada.

Volto aos artigos, após um longo período de silêncio. 

Sobre o jogo não me atrevo a dar grandes opiniões. Continuo a tentar melhorar como jogador. Vou evoluindo muito devagar, num espírito de humildade que caracteriza os jogadores de golfe, que sabem que nunca vão dominar este jogo.

Posso, no entanto, ser útil enquanto profissional da indústria. Como todos os que trabalham e vivem do golfe, sinto que devo dar algum retorno a esta atividade. Não escondo que o confinamento, a que sou seriamente convidado a aderir, me dá algum tempo adicional para este tipo de atividade.

Escolhi, para este artigo, um assunto que está relacionado com o dia-a-dia de cada um de nós, enquanto pessoas, profissionais ou jogadores.

Falo-vos da pesquiza da causa raiz de qualquer problema através da análise dos 5 Porquês.

Como surgiu o método dos 5 Porquês?

Quando falamos em métodos para fazer a análise de causa raiz, é sempre interessante perceber em que contexto surgiu. A técnica dos 5 Porquês foi desenvolvida por Sakichi Toyoda, o fundador da Toyota. Segundo os princípios de Toyoda, “a máquina pára quando ocorre um problema”. Perguntar “porquê” 5 vezes permitia descobrir a origem desse problema – e a solução para o prevenir tornava-se clara. O conceito fez parte do sistema da produção da Toyota durante a expansão da empresa, e hoje continua a ser aplicado como parte de uma metodologia lean, conceito a desenvolver noutra ocasião. 

Antes de prosseguir deixem-me dizer-vos que é fascinante constatar o que a indústria automóvel tem para dar e ensinar a todos os sectores de atividade.

O Japão é um dos grandes exemplos na qualidade da construção dos seus carros, com destaque para a Toyota, onde surgem muitos dos conceitos e metodologias aplicadas não só em outros construtores automóveis, mas também nas mais variadas indústrias e atividades. Pensei que o golfe não seria exceção e que poderia beneficiar, como qualquer outra indústria, de tão doutas e úteis práticas.

O que é a análise dos 5 Porquês?

A análise dos 5 Porquês (“5 Whys” ou “5Y”) é um dos muitos métodos para encontrar a causa raiz de uma avaria ou problema. (Interrompo para vos dizer que irei deixar de referir avaria, que se refere muito especificamente à indústria automóvel, e vou passar a falar de problema).

Este é um método interrogativo, em que se pergunta o porquê de cada evento que antecedeu o problema, até encontrar a causa raiz. Geralmente, 5 perguntas são o suficiente para chegar à resposta, daí o nome “5 Porquês”. 

A grande vantagem deste método é reconhecer que há uma série de eventos que antecedem e provocam o problema. Quase sempre decorre de um conjunto de causa-efeito, ou de um “efeito dominó”, e não de um evento imediatamente anterior. A análise dos 5 Porquês é um método simples e rápido para tentar determinar a verdadeira origem do problema, que pode ser usado numa grande variedade de contextos. 

Como funciona o método dos 5 Porquês?  

Usemos um tema atual.

Imagine que se sente com tosse. Certamente que toma um xarope para aliviar os sintomas, mas isso não é uma cura. Para isso, tem de se perguntar “porque tenho tosse?” ⇢ infeção viral ⇢ “porque tenho uma infeção?” ⇢ contraí o vírus Covid-19 ⇢ “porque contraí o vírus?” ⇢ mantive contacto próximo com um doente infetado. Nem precisámos de 5 perguntas para chegar a uma resposta!

A partir daí, deduzimos rapidamente não só que precisa de um xarope, mas também que a solução para evitar ficar doente é manter o distanciamento social. Claro que este é um exemplo simplista – todos sabemos que contraímos o Covid-19 porque tivemos contacto com alguém infetado – mas não teríamos chegado a estas respostas se alguém não tivesse passado pela “fase dos porquês” antes de nós. 

Repare que nem sempre podemos seguir um pensamento linear para encontrar a causa raiz. Em alguns casos existem múltiplas potenciais causas raiz, o que obriga a explorar as diferentes respostas a cada “porquê” e encontrar todas as sequências possíveis. Por exemplo: 

O carro não pega. ➝ Porquê? ➝ Não tem bateria. ➝ Porque é que que a bateria ficou sem carga? ➝ Os faróis ficaram ligados durante horas com o motor desligado. ➝ Porque ficaram ligados? ➝ Não houve nenhum apito de alarme nem se acendeu nenhuma luz de aviso no painel de controle. 

A partir daqui o nosso diagrama divide-se: 

➝ Por que não houve nenhum alarme? ➝ O sensor falhou. ➝ Porquê? ➝ O sensor nunca foi substituído. 

➝ Por que não se acendeu nenhuma luz no painel? ➝ Houve um problema elétrico. ➝ Porquê? ➝ Os fusíveis estão danificados. 

Quando esta análise se “desdobra” em muitas possibilidades, quase sempre é um sintoma de que há falhas nos processos de qualidade e de deteção de erros. Não nos podemos esquecer que estamos a analisar o processo, não as pessoas, por isso não devemos aceitar o “erro humano” como causa raiz. De certeza que há algum processo de controle de qualidade, nem que seja apenas uma checklist, que não foi executada. 

Que aplicabilidade tem, esta análise, no golfe?

Como em qualquer outra indústria há problemas recorrentes no golfe cuja causa é mais ou menos conhecida, mas não está taxativamente identificada.

Alguns exemplos de problemas que os campos de golfe e os jogadores sempre têm e que, se souberem as verdadeiras causas, podem iniciar o caminho para as resolver:

  •        Em relação à Indústria: porque não há mais pessoas a jogar golfe em Portugal? Porque é que para os jogadores os preços para jogar são altos e para os campos são insuficientes para viabilizarem a sua operação?
  •        Em relação ao jogo: Porque é que há jogo lento? Porque não consigo baixar de handicap?

E tantas outras questões que cada um, enquanto profissional ou jogador, pode ter.

Como fazer uma análise dos 5 Porquês?

São os seguintes os passos para executar uma análise dos 5 Porquês: 

1. Reúna uma equipa.

Como qualquer ferramenta de análise de causa raiz, este método não deve ser executado por uma só pessoa. Reúna outras pessoas que tenham conhecimento sobre o assunto, e que estejam dispostas a olhar para o problema de outra perspetiva e a explorar todas as respostas. 

2. Defina o problema.

É preferível que todos os envolvidos possam testemunhar o problema que se pretende analisar. Todos têm de concordar na descrição do problema. Por exemplo, todos têm de chegar à conclusão de que a definição mais apropriada do problema é, por exemplo, “a maioria dos campos da região de lisboa não ganham dinheiro na operação” em vez de “há poucos Portugueses a jogar golfe”, já que teria implicações diferentes nas etapas seguintes.  

3. Comece a perguntar “porquê?”.

Definido o problema iniciam-se as perguntas. As respostas precisam de corresponder aos factos e não a suposições. É provável que nem todos os membros da equipa apresentem as mesmas respostas, por isso têm de debater até chegar a um consenso.

No exemplo acima, em que se pretende saber a causa da maioria dos campos de golfe da região de Lisboa não libertarem dinheiro na operação, perguntamos porquê?

  1.   Porque a oferta de golfe nesta região é superior à procura. Porquê?
  2.   (aqui podemos divergir na resposta. Ou focamos nos poucos jogadores residentes ou na pouca capacidade de atrair jogadores estrangeiros). Opto pela resposta de que há poucos jogadores residentes na região de Lisboa. Porquê?
  3.   (outra vez várias respostas possíveis) Porque o golfe é uma modalidade cara. Porquê?
  4.   Porque o investimento nas infraestruturas (campo e edifícios de apoio) bem como os custos de operação são altos. Porquê?
  5.   Porque a maioria dos campos estão inseridos num projeto imobiliário logo o Plano de Negócios não previa a viabilidade da operação do golfe, per-si

4. Aprender a parar.

Não convém parar cedo demais – tente chegar pelo menos às 5 perguntas.

Mas, quando as respostas não são úteis para perceber a causa do problema, ou quando já não nos dão sugestões sobre as potenciais soluções, é altura de parar.

5. Planeie alterações ao seu plano de manutenção.

Depois de terminar a análise, o grupo deve debater se de facto encontraram a raiz do problema. Nesta fase, pode ser útil rever todas as respostas. 

No fim pode-se avançar para a eliminação das causas. 

No exemplo acima penso que podemos prescrever uma solução: existência de Planos de Negócios de golfe viáveis per-si, a pensar nos jogadores locais.

 

Boas análises!

 

Simão da Cunha - Agrónomo, director da Native Golf Services

Confinado em Lisboa, em 20 de Janeiro de 2021

 

Nota: escrevo segundo o novo acordo ortográfico porque tenho um corretor do computador que a isso me obriga.

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