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Uma escola para a vida
Crónica

No mundo do vale tudo, encontramos no golfe atitudes que só podem ser consideradas nobres

O golfe eleva-se acima de muitos outros desportos num importante aspeto: é o único em que um jogador marca faltas a si mesmo. Esta realidade enaltece a modalidade e sublinha o inerente fairplay.

Nos fairways o espirito da lei é tão importante quanto a letra e por muito que não concordemos com regras absurdas, elas são para cumprir. É necessária fortaleza para encarar bunkers, lagos, árvores, greens tortuosos e roughs densos agindo sempre de forma correta apesar de ninguém estar a ver. Daqui resulta o código de honra que une todos os praticantes e sem o qual o castelo ruiria.

No mundo do vale tudo, do ganhar a todo o custo, onde as regras são subvertidas e as televisões emitem imagens de atletas a enganar árbitros encontramos no quotidiano do golfe atitudes que só podem ser consideradas nobres.

Nos últimos meses foram noticiados dois casos paradigmáticos. No BMW PGA Chamionship, o veterano Ernie Els declarou uma penalidade de duas pancadas contra si próprio. A bola de Els tinha caído num bunker à beira do green e encontrava-se enterrada numa posição difícil. A bola estava tapada, por isso Els levantou-a para confirmar que era sua e acabou por fazer um excelente chip-in para eagle.

Todos aplaudiram e o jogo teria seguido naturalmente, não fosse Els ter indicado que a bola saiu demasiado bem para a forma que estava originalmente enterrada.  Ou seja, Els marcou uma penalidade a si mesmo baseado na vaga ideia que terá feito um erro impercetível a todos menos ele.

Outro exemplo é o de Kaylee Gossen que joga na equipa do seu liceu no Minnesota. Kaylee tinha acabado de entregar um cartão de 82 pancadas, que daria para levar a sua equipa às finais estaduais, quando sentiu uma hesitação. Após rever a volta com os pais chegou à conclusão que ela e a marcadora se tinham enganado em uma pancada.

Apesar do erro não afetar o resultado do torneio as regras ditam que a penalidade por entregar um cartão incorreto é a desclassificação do jogador. Neste caso, sem o resultado de Kaylee a equipa, como um todo, não passaria às finais. A jovem não pestanejou e com lágrimas nos olhos dirigiu-se à Comissão Técnica onde a atitude foi apoiada pela família, pelo treinador e pelas parceiras de equipa.

Não sei se o golfe imita a vida ou se a vida imita o golfe. Mas estou certo que o golfe proporciona inúmeras oportunidades de crescimento pessoal desenvolvendo princípios como humildade, honestidade, responsabilidade e perseverança. Se são estes os valores que queremos ensinar aos nossos filhos não há melhor escola. E a verdade é que quem quer jogar golfe deve entranhá-los porque no campo não há escapatória e os traços de personalidade, bons e maus, ficam expostos à vista de todos. 

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*Gestor e sócio fundador do clube de golfe Tigres do Bosque

** Esta crónica foi originalmente publicada no suplemento de golfe do Público de 10 de Junho

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